quinta-feira, 29 de março de 2012

Nu como a um anjo te apresenta ao mundo ou ao paraíso?

João Domingos Pinheiro Filho

Intriga-me a produção e difusão de imagens das pessoas por meio das redes sociais. Não tenho a pretensão de questionar ou validar as atitudes, ou, muito menos, discorrer acerca das motivações. Minhas inquietações são de reflexão pessoal quanto a algumas particularidades que envolvem as imagens nas múltiplas possibilidades de se olhar e interpretá-las.
Ultrapassar o simples momento de registro, congelamento do instante, perpetuar o efêmero do vivido, dar contornos ao cotidiano. Eis um pouco do resultado que nos chega à
superfície do contato com a obviedade dos arquivos digitais das imagens de pessoas. Olhar a própria imagem que reproduz ou imita a vida, rompendo os limites da temporalidade de duração do original. A imagem é você representado na parcialidade do captado pelos equipamentos óticos (megapixel ou nitrato de prata), sendo, portanto um alcance limitado? Restrito a estética do apresentado? Ou estaríamos diante do mergulho da intimidade, da quebra da privacidade e do reconhecimento pelo enquadramento da aparência?
A profusão de imagens pessoais ao alcance de estranhos por meio das redes sociais provoca em mim o sentido de especular até onde a imaginação os levará. Quem não viveu
contigo, te reconhecerá na(s) imagem(ns)? Quais são contornos que emergem de quem se é quanto se rende a curiosidade dos olhares da publicização do cênico de ti?
Quem sabe teu nome, convive ou conviveu na experiência de tua existência (amigo,
familiar), te avaliam no confronto as tuas ideias, posicionamentos, gostos, condutas e posturas. Possuem referências.
Ao ver tua imagem na imitação plana do teu corpo certamente terão a aproximação de um alguém plausível. Que por diferentes condições de (re)conhecimento fazem e refazem a conceituação de você, ou, em outras palavras e sentidos, quem é você.
Por outro lado, existe uma multidão de outros tantos estranhos, que no contato do visível
empreendem devassar o consumo especulativo da tua imagem. Até onde as imagens podem os levar: ao desejo dos contornos, a admiração da ousadia, a censura, a instigação para uma aproximação. Imagens são composições de histórias, que sugerem arranjos e rearranjos infindáveis de contextos. Sempre somos influenciados pela capacidade de ajuizar posição diante do mundo mediada pelos estímulos.
O que alguém vê depende do que se viveu. Então o que dizer da vida do outro vindo pelo
olhar? Como ter a noção das emoções erigida se cada pessoa que nos olha nos vê à sua maneira. Se não vêem a dor como podem ser tocados pela angustia sutil que esconde o sorriso solicitado? Se me reconheço em uma foto é pela capacidade de se revisitar em um auto-retrato, o reflexo reconhecido de mim mesmo. Mais como é a construção deste confronto entre estranhos - observador e do observado?
Meu retrato é um espelho de um passado no constante do presente. Ao outro diante do meu retrato será sempre um conflito de identidades, de um alguém no seu presente olhando o que já não mais sou.
Eis me aqui diante exclusivamente de mim mesmo.
Caruaru, 22 de fevereiro de 2012

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